quarta-feira, 28 de maio de 2008

Na mesa do Itamaraty e de Dona Severina


Patrimônio cultural e imaterial de Pernambuco, o bolo-de-rolo também foi escolhido recentemente para ser o doce oficial do receptivo do Itamaraty. Quando os gringos chegam, caem logo de boca no que os "sulistas" teimam em chamar de "rocambole". Vamos perdoá-los, caros conterrâneos. Eles tentam comparar, mas o nosso bolinho é incomparável e motivo de orgulho.

Não só para gente abastada, que investe R$ 24,90 no quilo do bolo-de-rolo da tradicional Casa dos Frios. A mesma receita, com singelas modificações, também pode ser saboreada com café quente por Dona Severina e sua enorme família de seis filhos, dez sobrinhos e doze netos, moradores do Alto Santa Isabel, Zona Norte do Recife. No mercado popular de Casa Amarela, o melhor bolo-de-rolo é vendido na Grandão do Queijo. A loja fica no prédio anexo do mercado e é a única que vende o bolo, por R$ 11 o quilo, feito por Valdir da Silva (um boleiro de mão cheia).

Quinta-feira fui lá. Comprei logo um inteiro, com 1,192 kg. Paguei exatos R$ 13,10. Cheguei em casa e dei a primeira fatia para o maior apreciador de bolo-de-rolo que a Terra já viu. Para você ter uma idéia, meu filho, com quase seis anos, diz que quando crescer vai casar sabe com quem? "Com o bolo-de-rolo", responde ele sem deixar dúvidas sobre sua enorme paixão. Sim, ele comeu a primeira fatia e virou os olhinhos. Pediu a segunda, a terceira e quando já solicitava a quarta fatia, barrei. "É que é o melhor bolo-de-rolo que já comi, mamãe!", soltou o especialista com cara de quero mais.

Valdir nem sabe, mas serei compradora oficial da iguaria que ele prepara. É uma questão de integridade familiar. Talvez ele tenha até que aumentar a sua produção diária de 30 bolos-de-rolo. Valdir, policial militar, aprendeu a receita com a tia, Marlene. Gostava, quando menino de comer as delícias que ela preparava. "Para não incomodar, comecei a aprender e a fazer meus próprios bolos e tortas", conta ele, que, aos 44 anos, percebeu que o seu bolo-de-rolo é garantia para ajudar a sustentar três filhos. Faz tudo com muito carinho, na própria cozinha de casa.

Pensa em daqui a uns cinco anos, quando se aposentar do quartel, montar uma fábrica especializada no bolo que é a cara de Pernambuco. Enquanto isso, fornece para revenda no Grandão do Queijo e come suas fatias de camadas finíssimas com a família. Às vezes polvilha o bolo no queijo ralado, come com requeijão e até com sorvete.

RECEITA

Bolo-de-rolo
(Por Valdir da Silva, do Universo dos Doces)

Ingredientes

-250 g de açúcar
-250 g de farinha de trigo peneirada
-150 g de manteiga
-6 ovos
-300 g de creme de goiaba ou goiabada derretida com um pouco de água

Modo de preparo

Misture delicadamente o trigo, os ovos e a manteiga até formar uma massa homogênea. Unte quatro tabuleiros grandes. Espalhe a massa sobre os tabuleiros. O segredo para a massa ficar fininha é retirar o excesso com uma espátula. Coloque a massa para assar, como qualquer bolo.Deixe esfriar. Desenforme com ajuda de papel manteiga ou de uma toalha. Passe o creme de goiaba sobre a massa e enrole as camadas, uma sobre a outra. Se desejar, polvilhe o bolo sobre açúcar refinado.


SERVIÇO
Grandão do Queijo// Prédio anexo do Mercado de Casa Amarela. F: 3442.5335.

Mês sem R, caranguejo gordo

...
foto: Beto Figueirôa

Estamos no primeiro mês do ano sem a letra R. Depois de maio, vêm junho, julho e agosto. Um tanto óbvio. Mas o que isso tem a ver? Muita coisa, exclusivamente para quem aprecia um suculento caranguejo gordo. Pois é, na sabedoria popular é neste curto período de quatro meses que os bichados, moradores dos mangues, estão prontinhos para o abate. Para quem não sabe, caranguejo não engorda em cativeiro como seu primo guaiamum (aquele de aparência limpinha, ‘afrescalhada’, sem pelos nas patas e que prefere a areia do rio ao invés de lama).

Gosto dos dois e devoro das patinhas ao corpinho. Mas nesta época, procuro mesmo é pelos amigos carangas, cabeludões e de sabor inconfundível. Para quem jamais encarou a missão de degustar um (ou dezenas), posso dar algumas dicas (com toda a pompa de uma comedora de caranguejo de primeira categoria). Pra começar, nem pense em ser iniciado nesta arte sem paciência. Comer caranguejo, da maneira mais correta (ou seja, sem deixar escapar nenhum vestígio de carne) é coisa para pessoas persistentes e sem frescura.


O ritual é o seguinte: comece pelas patinhas menores; vá quebrando as articulações e chupando a carne e o caldinho. Quando se quebra errado, o jeito é usar o cacetinho. Não vale começar pelas patolas, porque assim as menores podem perder a graça ao longo do processo. Depois que todas as patas tiverem virado estilhaços, aí sim, avance no corpinho. Para mim (e com certeza para outras pessoas que sabem o verdadeiro valor de um caranguejo), é a melhor parte! Ao final, você sentirá uma sensação relaxante; os dedos estarão meio cortados e o beiço ficará "em flor".

Numa mesa com caranguejada posta há, além de rituais, regras. E uma das mais importantes é: jamais pegue a patola ou o corpinho de outro comedor. Você pode causar repulsa e ser expulso à base de cacetinhos, como já vi acontecer com um amigo guloso que roubou a bundinha do caranguejo do companheiro ao lado. Desculpe, não expliquei: a bundinha, no vocabulário caranguejal é aquela parte carnuda, logo abaixo da cabeça sem cérebro. Sim, porque esse negócio de que caranguejo tem cérebro, na prática não existe. O que tem lá dentro do juízo do bicho é muita gordura (nos meses sem R) e cocô. Há uma forma de retirar a porcaria, mas isso só dá para ensinar ao vivo.

Abaixo, ofereço a receita do bar e restaurante Confraria do Mar, na Encruzilhada. Quando não me atrevo (ou me falta energia para preparar a caranguejada peço a o meu tira-gosto preferido pelo telefone. Isso mesmo! Este serviço genial de delivery (3427-9432) leva até a porta de sua casa um baldinho lacrado, com caranguejos deliciosos feitos com caldo de verduras e até enriquecidos de molho de coco. Irresistível!

RECEITA

Caranguejada
(Por Kiko Laporte, do Confraria do Mar)

Ingredientes


-20 unidades de caranguejo
- 4 tomates médios cortados na metade
-3 cebolas médias inteiras
-1 maço de coentro
-2 pimentões cortados na metade
-500 ml de leite de coco natural
- sal e pimenta do reino a gosto


Modo de preparo
Compre os caranguejos vivos na feira livre (é fácil achar na feira de Casa Amarela, Recife e na feira de Rio Doce, Olinda). Uma corda vem com cerca de dez caranguejos. Em casa, ao invés de matar um a um na faca, a sugestão matá-los em um caldeirão. Coloque-os ainda amarrados no caldeirão com água fria. Não em água quente, pois as patas caem. À medida que a água vai esquentando, eles vão morrendo. Quando já estiverem bem fraquinhos, antes da água ferver, deslique o fogo. Pronto. Pode desamarrar a corda e levá-los ao tanque para a limpeza. Retire a lama em água corrente e, se quiser, depile as patas com uma faca amolada ou até mesmo com gilete.
Num caldeirão, refogue um pouco as verduras em óleo e acrescente os caranguejos. Cubra-os com água e deixe cozinhar. Ao final do cozimento, após 40 minutos, adicione o leite de coco. Sirva e acompanhe a farra com cerveja bem gelada.