quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Saudade dá fome

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27.07.08



Toda vez que penso em gente que se foi, momentos bons que passaram, lugares lindos que visitei, roupas velhas que eu dia usei, minha barriga ronca. Outro dia acordei com saudade do meu pai, que o tempo maluco não permite maior presença. Veio a vontade de um bolo de banana que ele fazia quando eu era criança e também do bife acebolado que preparávamos juntos às altas horas da madrugada. Da minha vó Nilda, sempre sinto falta. E por isso como feijão preto quase todos os dias. Tem também aquele oco que bate dentro do peito e você nem sabe ao certo o que é. Uma dor de ausência que desce para a barriga e geralmente a faz roncar. Deve ser a tal saudade do futuro.

Outro dia fiquei recordando os dias de adolescência na praia do Janga. Aquela que ainda era recheada de coqueiros na areia branquinha. Tomava banho de mar até o meio-dia e chegava em casa faminta para bater o prato de domingo. Minha mãe, exímia cozinheira, tirava folga do fogão e caminhava até a barraquinha da esquina. Lá, adquiria uma dobradinha saborosa,que comíamos apenas com "farofa de macumba" - aquela bem amarela. Era a barraca de Dona Zuza. Uma lona azul protegia da chuva e do sol o fogo à lenha. A gente levava a vasilha e a senhora cozinheira a enchia com prazer, até quase transbordar. Tinham dias que ela fazia fava com charque e, não sei porque, eram domingos inesquecíveis.

Tão bons, que sinto saudades e, claro, me bate a fome. O Janga está longe e Dona Zuza nem deve mais existir. Mas, dia desses, revivi pelo paladar as lembranças daquele tempo. Minha comadre me levou para comer a dobradinha e a fava com charque de Nancy, mãe de um velho amigo. Nancy, que é despachante por profissão e cozinheira por paixão, prepara todos os finais de semana caldeirões de feijoada, dobradinha, fava e sarapatel. Em frente à sua casa, estica um toldo e vende o quilo de cada uma das iguarias por R$ 25. Quem quiser sentar e comer por lá mesmo, na beirada da calçada, também pode.

Matei a saudade, mas confesso, tenho uma mania estranha de sofrer por antecipação. Daí fico martelando quais serão as minhas próximas saudades e que comidas vão entrar pela boca para me ajudar a reatar boas lembranças. Quem sabe sorvete e milho na pracinha; maltado no Bairro do Recife; macaxeira na calçada de Darcy; bobó de camarão nos aniversários; churrasco na casa do vizinho.

RECEITA

Fava com charque

(Da Feijoada da Nancy)

Ingredientes
- 1 kg de fava
- 1 kg de charque dianteira
- 1 maço de coentro
- 1 maço de cebolinho
- 2 cebolas grandes
- 1 colher de chá de colorau
- 1 colher de chá de cominho
- 1 colher de sopa de alho
- 3 folhas de louro
- 2 tabletes de caldo de carne

Modo de preparo

Coloque a fava de molho de uma dia para o outro. Em outro recipiente deixe de molho também a charque. De manhã escalde a charque até sair bem o sal. Misture a fava e a charque numa panela com água. Ligue o fogo. Enquanto isso, bata no liqüidificador o coentro, a cebolinha, as cebolas e o alho. Despeje tudo na panela, junto com a fava e a charque. Acrescente os tabletes de caldo de carne, as folhas de louro e cozinhe, sempre medindo a quantidade de água para não secar demais. O tempo de cozimento é em torno de duas horas, sem pressão. Sirva com arroz, couve à mineira, ou se preferir, só com "farofa de macumba".

SERVIÇO //
Feijoada da NancyEstrada do Encanamento, 1198, Casa Amarela. F: 3266-02710.

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